Tons, semi-tons e paulistas (2006)


Missões diferentes
A contabilidade para o segundo turno não é difícil. Lula tem que reconquistar seus eleitores que na última hora resolveram lhe “dar uma lição”, e mostrar aos eleitores de Heloísa Helena e de Cristovam Buarque que a volta dos tucanos ao poder é pior do que a continuidade petista. Ou seja, tem que falar para quem entende o seu discurso.
Já Alkmin tem que convencer eleltores que não se afinam com o sua pregação, ele tem que falar para outras platéias. E não só falar, mas convencê-las a mudar de orientação. Uma tarefa muito mais difícil do que a do presidente.
Auto-engano
O debate da TV Bandeirantes foi tratado pelos alckmistas segundo o manual tucano-pefelista: repetir à exaustão que Geraldo tinha vencido. E a imprensa seguiu na mesma linha da imagem de uma luta de box. É mais um exemplo de estreiteza de um raciocínio que não admite nuances, conjunturas, tons intermediários entre o preto e o branco.
As pesquisas posteriores à “luta” demonstraram que o mais importante que ocorreu naquele debate foi o movimento realizado por Lula jogando Geraldo para a direita do espectro político, que aliás é seu lugar. Com isso, votos de Heloísa Helena e de Cristovam mudaram de lado e foram para o petista. D. Gladys, esposa de Cristovam é um exemplo. Crédito para Fernando Abrúcio, que no programa “Canal Livre”, no dia seguinte ao debate, cantou a pedra.
Lições
Programas eleitorais e propagandas políticas não ganham eleições, perdem. O primeiro turno mostrou um programa do PT sem erros e Lula não ganhou. O programa tucano seguiu a cartilha do século passado, e claramente, não foi fundamental para a passagem de Geraldo para o segundo turno.
Agora, o desafio das campanhas na TV é muito maior. 5 minutos é um tempo razoável para um programa político. 10 minutos dobram as chances de fracasso. É só pensar nos programas petistas e tucanos no primeiro turno e multiplicar por dois. O do Lula corre o risco de ficar parecendo uma enxurrada de números e siglas. O do Alkmin, de ser o mais chato programa eleitoral de todos os tempos…
Criar, escrever, produzir, editar e finalizar programas de televisão de 10 minutos diariamente, sob intensa pressão de diferentes lados não é fácil. Talento, competência, sangue frio e precisão nos detalhes são fundamentais nessa hora, e não á à toa que os profissionais especializados foram supervalorizados. Não é jornalismo, não é publicidade, é a fusão dos dois aquecida pela direção política.
Então vamos a eles
Os 4 primeiros programas do 2o turno confirmam os prognósticos. A qualidade técnica caiu em ambos. O programa do Lula segue na linha do “muito já foi feito, mas ainda há muito por fazer”, idealizada po Geraldo Walter para a reeleição de FHC em 98, e que se mostra até hoje insuperável. À enxurrada de números se somam propostas para o segundo mandato, entremeadas por falas do candidato e de sua turma de apresentadores, que tem se mostrado muito competentes.
O programa tucano, passado o “momento Pindamonhangaba”, tenta apresentar “O candidato que o Brasil precisa”. Quem tem memória lembra que no primeiro turno o slogan era: ”Um presidente do tamanho do Brasil”. Por lunático, foi engavetado. E o mesmo deveria ser feito com seus redatores, que insistem em enumerações e frases sem verbo e sem fim, que inexoravelmente caminham para um triunfal “enfim, fazer o que tem que ser feito!”.
Verdade seja dita: a falta de conteúdo programático da candidatura PSDB/PFL dificulta sobremaneira o trabalho dos escrivãos, mas tudo tem limite. Nas palavras de Marcelo Coelho, colunista da Folha: “É vexaminoso, para quem se apresenta como a opção mais racional e técnica, o vazio de idéias e argumentos do candidato tucano, em sua primeira aparição no horário eleitoral. Os locutores anunciam, em triunfo, que no debate da Bandeirantes "Geraldo apresentou as melhores propostas". Saúde? Vamos melhorar a saúde do povo. Emprego? Nosso compromisso será com a geração de empregos. Segurança pública? Seremos firmes nessa questão. De concreto, apenas a idéia, que não poderia ser mais demagógica, de vender o Aerolula para construir hospitais.” É de envergonhar seus eleitores, o que dirá os de Heloísa Helena e Cristovam.
Sul maravilha?
Continua em curso, embutida nas leituras sobre a preferência popular por Lula, o fortalecimento da tese elitista e do preconceito contra o norte e o nordeste do país. Os brasileiros que vivem nas duas regiões eram considerados atrasados por se sujeitarem às velhas oligarquias, agora são ignorantes por votarem no candidato do PT e em seus aliados.
Apesar de Alagoas, onde Heloísa Helena abriu caminho para a volta de Collor, o voto nordestino se mostrou muito mais responsável do que o de São Paulo de Clodovil, Maluf e Frank Aguiar, o cãozinho dos teclados. Dos estados do sudeste, foi só em São Paulo que Alckmin venceu Lula.
Nas palavras definitivas de Mino Carta: "Entendo que, embora mais rico, o estado de São Paulo é politicamente mais atrasado. Explico: na minha opinião, é o mais reacionário. A dita elite paulista, tomada em bloco (exceções haverá, está claro), é ignorante, exibicionista, deselegante, egoista. Ostenta com gosto insano. Campeã em platitudes variadas, na repetição de lugares-comuns monumentais. Neste exato instante, mostra uma sujeição atroz às versões da mídia, e assume passivamente as frases feitas que aquela divulga com notável potência tecnológica. Falta espírito crítico, falta ironia. O pessoal leva-se a sério."

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